domingo, 4 de decembro de 2011

CARTA A ALGÚNS DOS MEUS “ filhos ”

Como podeis, meus filhos, matar-me assim? Calar-me assim ? Que cruel ensino vos dei que não vos ensinei nada? Como podeis esquecer-me e deixar que os vossos filhos e netos, filhas e netas, os meus descendentes todos, sangue do meu sangue e das minhas entranhas, me esqueçam? Que não me conheçam, que nunca saibam o devenir da minha vida de sacrifício e de luta por vós e para vós, para serdes quem sois? Como podeis, os que hoje sois, os que eu não concebim para serdes assassinos da história, da cultura, da terra, da Mãe ?


Eu dei-vos as pólas e as pola; eu dei-vos os matojos, as vidoeiras, as abeleiras, as ameixeiras, as cerdeiras, os marmeleiros, as maceiras, o ar que respirais e a espuma do mar... e vós, devolveis-me pesadume, perversidade, ignorância e dor. Quereis-me condenar de novo ao SILÊNCIO.


Sabeis quem sou? Quem é a vossa mãe? Sabeis de mim, da minha história, do meu devenir? Nascim da mistura de povos. Sim, sou-vos “mestiça”, filha da convivência de bárbaros e nativos, mais nunca me causaram mais dor da que vós me causais. Eles foram meus pais e deram-me pulo, formaram-me, cultivaram-me e enriqueceram-me. Fui percorrendo os caminhos da minha vida crescendo e lustrandom-me. Tive uma infância feliz a pesar do meu nascemento humilde, cresci en paços e Cortes, aínda que tambem baixaba às cortes e aos cortelhos. Ali esteve a minha origem. Rodeei-me de reis e princesas que estavam comigo, que jogavam comigo, que me enchiam de beleza, formosura e riqueza, que espalhavam o meu nome por toda a terra culta, fazendo-me sentir a mais grande e bela até que uns vossos ancestros, -a pior parte de mim e dos que deveis ter herdado, meus filhos-, de perversa genética decidiram recluir-me nas torres do esquecimento. Mas segui vivendo - porque há que viver -, segui sendo fiel às Cortes e aos cortellos, às agros, às rias, às arvores e à terra. Convivi com os lavregos, marinheiros e poetas. Botei aos franceses que também não queriam perceber a minha sensibilidade. Tive que lhes fazer armadilhas e botá-los porque não desejavam bem para mim nem para vós mas com o tempo recuperei a minha dignidade ferida. Na miha madureza volvi florescer, pus-me de novo lustrosa e bela e cresci de novo, brilhei coma uma estrela. Segui madurescendo e retornei a ledice, mas chegaram momentos de conflito quando pensavamos que recuperaríamos o perdido durante muito tempo e novamente fui agredida. Feriram-me e cai na longa noite de pedra, no negro silêncio da ausência.


Como Ave Fénix refulgi de novo, coma o sol, quando renasce num formoso amanhecer e chegando a hoje, quando me poderia ver melhor, rodeada dos meus, querida e cuidada e aínda apreendendo e ensinando, vindes vós e criais em mim uma nova rejeição. Porquê ?


Porquê não quereis que os vossos filhos me conheçam e me queiram, como é de lei na natureza? Porquê me quereis de novo agachada? Porquê quereis levar ao esquecimento a minha vida e a minha existência? Porquê os vossos filhos devem dizer “ earth ” e não “ terra”? “ grandmother ” e não “ avó”? “ mother ” e não “ mãe”? Porquê quereis esconder a minha beleza? Porquê não me quereis, filhos ingratos, açoute das minhas veias?


Não conheceis os assobios, a saudade, e a morrinha, meus cachães? Como os chamais? Mas sim practicais o serdes cacharulos e godalhos, ainda que não saibais nen queirais saber, que é o que significa. Estais-me matando com uma pancada no cachaço, na brouca, na caluga e no pescoço con cachaço. Mas, sabeis que vos digo? Não vou fugir, não me vou agachar de novo, não vou desaparescer, NÃO VOU MORRER, enquanto haja gorjas que me gritem, enquanto haja gorjas que me emitan, enquanto haja gorjas que me chamem, enquanto haja bocas que me recitem, enquanto haja dedos que me acarinhem, enquanto haja mentes que me lembrem e me pensem, enquanto haja filhos que me amem e enquanto haja mestras e mestres, professoras e professores, mães e pais, filhas e filhos que me defendam, que me falem, que me mencionem, que me ensinem, que me AMEM.


Meus maus filhos!, filhos da ignorância e da violência, filhos da injustiça, do desarraigo e da doença, filhos da crueldade, do abuso e da incongruência, filhos mal elegidos, desalmados e insolentes, filhos que queriais ter nascido em outra terra, olhai o céu estrelado, as nossas costas e beiras, os nossos agros arados, a beldade destas terras e dizei-me se podeis resistir esta dor de rejeitar a uma mãe que requer a sua dignidade.

Publicada por " As Nossas Letras"

http://as-nossas-letras.blogspot.com/2011/12/carta-alguns-dos-meus-filhos.html

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